Uma cozinha no mar
Foi a segunda vez que entrei numa cozinha de um navio. Algures no meio do Adriático, a meio caminho entre Argostoli e Veneza, abriram-nos as portas para uma espreitadela à galley do Splendour of the Seas (o termo aplica-se a cozinhas em andamento, em aviões, comboios ou barcos/navios).
Todo o dia, literalmente 24/7, a comida chega a todo o lado no navio. É coisa que não falta, às vezes dá vontade de pedir a alguém para pararem de nos atirar comida à cara. Ao jantar chega à mesa com particular minúcia e não há noite em que desiluda.
Mas lá por estarmos num navio em andamento, não quer dizer que a vida da cozinha seja diferente de qualquer outra cozinha profissional. Só é diferente no número de refeições que é preciso servir. Por aqui, alimentam-se duas mil bocas esfomeadas todos os dias.
Há estações para tudo: o pão, as sobremesas, os grelhados e muito mais, há uma só para testar se os pratos estão com a qualidade desejável e podem seguir para a sala. O calor é muito mas as equipas que, para além de já terem o árduo trabalho de funcionar numa cozinha profissional desta dimensão, o fazem sem ir a casa meses a fio, não parecem queixar-se.
O abastecimento principal é feito no porto de partida, todas as semanas. Dizem-nos que é possível incluir produtos locais de cada porto de paragem mas que isso não pode afetar o orçamento que o chef tem para gerir. Dizem-nos também que muita da comida vem da Holanda, do fornecedor principal da companhia de cruzeiros, apesar de termos partido de Itália, de onde certamente só teriam vindo coisas boas. Mas a Holanda serve bem para o meu palato exigente, não me queixo.
Eram duas da tarde quando andámos por ali. O serviço de almoço já tinha terminado e já se pensava no jantar. No final, ofereceram-nos biscoitos acabados de sair do forno. Eu teria ficado por ali a cozinhar, mas só durante umas horas que claustrofobia contínua não é coisa que me agrade.