Não há nada de violento no manjar de que vos vou falar mas há nele o mesmo efeito revolucionário que teve o filme de Stanley Kubrick que dá título a este post. Uma mistura tão simples com resultados tão extraordinários. Já foi há uns bons anos que descobri esta sobremesa coqueluche da Serra da Estrela e assugero que é de fazer corar de vergonha os vaidosos autores de sobremesas complexas.
Nada mais do que um requeijão lá do sítio (e para os que não conhecem, garanto que o mundo dos requeijões tem ali a sua abelha-mestra) coberto com uma camada reluzente e laranja de doce de abóbora. O primeiro já se encontra facilmente em qualquer supermercado. O segundo faz-se sem grandes problemas a partir da matéria-prima protagonista.
Lá para os lados de Seia há ainda a tradição de colocar nozes partidas por cima mas eu não sou exigente e fico-me mesmo pelo básico. O branco do requeijão, o laranja do doce e uma colher para os devorar.
Ora, impõe-se descortinar a pertinência deste post: a minha avó fazia o melhor doce de abóbora que já comi na vida, não há quem consiga chegar-lhe aos calcanhares. No entanto, e feita esta premissa, é também justo dizer que a caixa de compota brilhante que me fez chegar o meu pai, vinda directamente da cozinha ribatejana onde cresci, não passa qualquer tipo de vergonha no campeonato dos doces de abóbora.
E foi por isso que hoje o requeijão teve de vir para casa comigo. Só não sei quanto tempo por cá vai ficar. Calculo que não muito.
O Tarantino tem boas cenas de pequenos-almoços. É a refeição mais importante do dia, sempre nos disseram, e ele também deve ter ouvido a mesma cantiga (ainda que noutra língua). Temos, no “Cães Danados” o Mr. Brown, o Mr. Blonde, o Mr White, e por aí fora, todos à conversa sobre a semântica da lírica madonniana enquanto tomam um pequeno-almoço calórico. E temos, no “Pulp Fiction”, o hambúrguer roubado e mastigado por Samuel L. Jackson ao sujeito que, minutos mais tarde, vai furar com uma dose considerável de tiros.
Tudo isto para transportar-vos para o cenário mais improvável num filme do Tarantino. Um terraço de uma pequena casa de turismo de habitação, em Vila Nova de Milfontes, onde tomei os melhores pequenos-almoços que a minha boca teve oportunidade de provar nos últimos tempos. (Nos últimos anos, arrisco.)
Casa do Adro é o nome do templo. A D. Idália é a guardiã suprema do mesmo. O recato daquela rua em Milfontes quase nos faz esquecer de que estamos realmente em Milfontes e isso é bom. E melhor ainda é o aviso logo à chegada: não há horas para o pequeno-almoço. E não há mesmo. Até quando, depois de adormecer a horas impróprias, acordo também a horas impróprias com a porta a bater e um aviso: “Ainda servimos o pequeno-almoço”. Eram três da tarde, meus amigos. E eu disse que sim, sem qualquer entrave, porque um tesouro assim não se nega.
Mas qual o grande segredo deste pequeno-almoço? A singeleza misturada com a fartura. Uma travessa com papaia, melão, pêssego, laranja, figo. O doce… O sumo de laranja. O pão alentejano. Mais! O Pão alentejano torrado e a ainda a deixar escorrer, pecaminosamente, a manteiga. O presunto. A tábua de queijos. Os ovos mexidos. Simples mas reconfortante, como todo o pequeno-almoço deve ser. Para isto, nem o Tarantino tinha a verve necessária.
editado por Quanto Mais Quente Melhor a 31/3/13 às 11:56
Nunca percebi. Por mais que ouça as queixas, as dúvidas e os afrontamentos de outros, nunca percebi. Nunca percebi o porquê de não se conseguir fazer um Molotov (ou Molotof, não sou esquisita) em condições. Eu faço-os desde miúda, com a simples e extraordinariamente eficaz receita da minha avozinha e nunca, literalmente nunca, houve algum que tivesse corrido mal.
Ou porque baixam de mais, ou porque queimam ou porque ficam com uma consistência menos satisfatória, já ouvi de tudo. E é por isso que, por mais que, na minha cabeça de fada do lar o que vem aí a seguir me pareça senso comum, quero ajudar todas(os) os que sempre quiseram fazer um Molotov bonitão e não conseguiram tirá-lo do forno sem que tivesse aquela deprimente descida aos infernos de uma forma de metal.
Primeiro: Batam, meus amigos. Batam as claras em castelo até ficarem mais firmes que a Torre Eiffel e, depois de juntarem o açúcar, batam outra vez como se o amanhã nunca fosse chegar. E batam ainda mais depois de o caramelo chegar para lhe dar aquela cor irresistível.
E depois? Não tentem calcar demasiado a mistura na forma. As claras de ovos não gostam de repressão. Deixem-nas conviver alegremente com espaços em vazio e deixem-nas ficar com picos em cima.
O temível forno: Não o tenham demasiado quente nem demasiado brando (é isso que pode fazer o abençoado doce queimar ou baixar rapidamente após a cozedura). E mais ou menos meia hora basta. Quando os gulosos picos superiores ficarem tostados, é sinal que é tempo de o tirar.
Para todos os que acham que ele não baixa depois de sair do forno, ai baixa sim senhores. Mas o que deve acontecer é baixar até à altura que tinha quando seguiu para a fornalha. Mais do que isso e algo correu francamente mal.
Último segredo: Façam-no no dia anterior ao manjar e desenformem-no apenas 24 horas depois. A diferença na firmeza e no gosto é significativa.
E pronto, é isto. Agora não digam que há desculpas.